Blogueiro descreve líderes do Oriente Médio e das Américas

Gustavo Chacra

Em seu livro Blink, o escritor americano da revista New Yorker ,  Malcolm Gladwell afirma que as pessoas podem formar uma opinião sobre algo ou alguém em apenas alguns segundos. Ou melhor, em frações de segundo.

Um especialista em arte renascentista pode ver um quadro e dizer imediatamente se é um Leonardo da Vinci original ou uma falsificação. Ao caminhar pelas ruas de Nova York, conseguimos quase sempre acertar quando uma família é brasileira ou não. É algo no andar, no sorriso, difícil de explicar. Na primeira frase de um professor de cursinho, decidimos se cabularemos a aula seguinte dele ou se o idolatraremos pelos corredores.

Nas minhas coberturas internacionais, tive a oportunidade de ver uma série de autoridades. Hoje, irei a uma palestra do premiê de Israel, Benjamin Netanyahu aqui em Nova York. Já o vi antes, no ano passado, durante a Guerra de Gaza, em um hotel de Jerusalém. Ele estava com o Benny Begin, outro político israelense, tomando café da manhã. No pouco que o observei, notei apenas que ele era atarracado, baixinho e seguro. Seu olhar era firme, decisivo.

Mahmoud Ahmadinejad eu vi aqui em Nova York, antes de reunião dele com Lula. Minúsculo, magro e com olhos perdidos. O líder iraniano parece aquele aluno frágil dos colégios, que gosta de provocar. Pode até apanhar, mas, no dia seguinte, já está provocando de novo, mesmo com o olho roxo.

Seu aliado, Bashar al Assad, presidente da Síria, teve um contato maior comigo. Alto, quase gigantesco, e magro, parece aqueles jogadores de basquete de clube. Seria um amador do time do Sírio nos anos 1980. O bigode dá ao líder sírio um ar antiquado, apesar de ele ser uma pessoa antenada com a alta tecnologia.

Entrevistei Rafik Hariri antes de ele morrer. Parecia o dono do mundo. Bilionário, primeiro-ministro, herói nacional, o libanês tinha dinheiro, poder e glória. E sua imagem esbanjava estas três qualidades.

Tzipi Livni, chanceler de Israel, é bonita, dura e com jeito de paulista. Parecia que eu já a conhecia há anos quando a vi depois de reunião com Celso Amorim. Ehud Barak, assim como Netanyahu, era compacto, forte, mas bem menor do que eu imaginava. O ex-premiê Ehud Olmert não exibia a segurança de Bibi e de Barak. Não passou pelo Exército. Era civil. Seu brilho era bem menor.

Vi Barack Obama discursar. Nunca de perto. Literalmente, era como se eu estivesse assistindo a uma TV. Já a secretária de Estado Hillary Clinton tem uma cara de “Nice to meet You”, com o sorriso aberto e forçado. Eu me lembrei imediatamente das amigas da minha mãe americana do intercâmbio na Carolina do Sul.

Manuel Zelaya era o charlatão em pessoa, forçado, com seu chapéu e um discurso populista que não enganou os hondurenhos. Michelleti não era muito melhor. Eu me lembrei imediatamente de dirigentes de clubes de futebol envolvidos em escândalos. Era difícil saber qual dos dois era pior quando os vi em San José. Já o então presidente da Costa Rica e Nobel da Paz, Oscar Arias, parecia um acadêmico americano perto dos dois. Metido, mas com ar de quem sabe do que está falando.

Dos brasileiros, vi Lula algumas vezes aqui nos EUA. É uma pessoa engraçada e que, goste dele ou não, consegue dominar o cenário onde estiver – a não ser que um Maradona ou um Fidel esteja nas redondezas. Fernando Henrique é bem humorado, feliz com a vida, por tudo que realizou. Dilma parece diretora de escola, pronta para dar uma suspensão. Também achei Marina Silva brava e séria em uma palestra da Columbia. Nunca me encontrei com José Serra.

Quem me marcou mesmo foi o argentino Carlos Chacho Alvarez, o vice-presidente que renunciou ao cargo – e deixou de ser presidente, já que tempos depois o ex-presidente Fernando de la Rua deixou o poder. Um dia, na praia de Juquehy, vi um homem de shorts Adidas dos anos 1980 andando em uma rua de terra. Ele levava um pacote de pães e não vestia camiseta. Parei o carro. Perguntei se era Chacho. Meio perdido, ele respondeu que sim com seu sotaque porteño. Era a imagem da decadência. Um homem que poderia ter sido presidente, perdido em uma praia do Litoral Norte paulista.

Sei que quase todas estas descrições acima foram feitas em um “blink”, uma fração de segundos. Conversei apenas por mais tempo com Assad, Hariri e Olmert. Mais tarde, talvez eu tenha uma opinião distinta de Netanyahu. No caso dos brasileiros, não há nenhuma opinião política nas minhas descrições. Este blog fala de política internacional, vivo fora do Brasil há cinco anos e não estou qualificado para falar das eleições ou dar uma opinião. Outros blogueiros do Estadão podem cuidar desta parte

O jornalista Gustavo Chacra, mestre em Relações Internacionais pela Universidade Columbia, é correspondente de “O Estado de S. Paulo” em Nova York. Já fez reportagens do Líbano, Israel, Síria, Cisjordânia, Faixa de Gaza, Jordânia, Egito, Turquia, Omã, Emirados Árabes, Yemen e Chipre quando era correspondente do jornal no Oriente Médio. Participou da cobertura da Guerra de Gaza, Crise em Honduras, Crise Econômica nos EUA e na Argentina, Guerra no Líbano, Terremoto no Haiti e crescimento da Al Qaeda no Yemen. No passado, trabalhou como correspondente da Folha em Buenos Aires. Seu blog foi vencedor do Prêmio Estado de Jornalismo em 2009, empatado com o blogueiro Ariel Palacios

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