Por trás do glamour da escuderia italiana de Fórmula 1, há milhões de euros investidos em tecnologia para ter o melhor carro da categoria, a estratégia mais inteligente da corrida e o piloto campeão da temporada
Por Rafael Barifouse
Quando as luzes vermelhas do Grande Prêmio do Brasil de Fórmula 1 se apagarem, Felipe Massa começará a corrida mais importante de sua vida. Sete pontos atrás de Lewis Hamilton, da McLaren, no campeonato, Massa precisa de uma performance brilhante – e de um deslize do britânico - para conquistar o campeonato. Mas o piloto brasileiro não depende apenas de si para se sair bem na pista nesse próximo domingo (2/11). O automobilismo é um esporte high-tech. Na sua principal categoria, a tecnologia tem papel ainda mais importante. Como disse o francês Jean Todt, ex-diretor-geral da Ferrari e seu atual representante no Conselho Mundial da Federação Internacional de Automobilismo (FIA), "na F1, velocidade é fundamental, não apenas na pista, mas também no design e na análise de dados".
"Sou um piloto eletrônico"
As escuderias investem entre 300 milhões e 400 milhões de euros em pesquisa e desenvolvimento de seus carros. Pelo menos nesse quesito, Massa leva vantagem. O modelo atual da equipe italiana é apontado como o mais constante em todas as pistas. Mas, para chegar até ele, muito foi feito antes mesmo de o campeonato passado terminar. Nas corridas da temporada anterior, cada volta foi analisada com cuidado. Essas informações foram reunidas em um grande banco de dados para a concepção do próximo modelo em computadores de última geração. "No começo, é tudo virtual", diz Massa. "Nessa parte, eu sou um piloto eletrônico".
A escuderia realiza pelo menos três testes por dia durante todo o ano na sua sede em Maranello, na Itália. Graças a simuladores, esse processo ganhou agilidade. "Antes você fabricava uma peça e a testava", afirma Roberto Brandão, gerente de tecnologia da Advanced Micro Devices (AMD), fabricante de microprocessadores e parceira da Ferrari desde 2002. "Hoje você faz simulações muito próximas da realidade". A equipe inovou nesse quesito há três anos, quando passou a incluir a previsão do tempo na preparação para as corridas. Isso é importante, porque afeta a performance. "Hoje todas fazem o mesmo", afirma Brandão.
Novas regras do esporte padronizaram pneus e a parte eletrônica e criaram limites para o giro dos motores e trocas de motor e câmbio. Por isso, uma parte aparentemente mais simples ganhou ainda mais relevância: a aerodinâmica do carro. "É o aspecto que nos permite fazer uma gama maior de mudanças para melhorar a performance", diz Dieter Gundel, diretor de tecnologia da Ferrari. Segundo o alemão, esses limites fizeram as equipes investirem ainda mais em pesquisa e desenvolvimento, mas nada substitui a experiência.
Na sala de telemetria,
engenheiros e técnicos pilotam
o coração do carro
É na pista que o carro é colocado à prova. Um modelo de F1 tem 150 sensores que captam 500 aspectos de sua performance. Tudo é criptografado para garantir que nenhuma outra equipe tenha acesso. No box, engenheiros acompanham tudo em computadores. Enquanto uma parte deles avalia os dados, outros simulam estratégias, planejam alterações e enviam instruções aos pilotos por rádio. "A telemetria é o coração do carro", diz Massa. "Ela mostra onde você perde, onde você ganha e o que precisa acertar". A equipe italiana se diferencia das demais nesse quesito. Uma nova regra criou uma telemetria padrão para todas as equipes, mas elas só a adotam se assim quiserem. A Ferrari optou por usá-la como um complemento ao sistema que já tinha. "Temos um acesso mais rápido e melhor aos dados, que assim são mais confiáveis", afirma Gundel.
Os motores usados na F1 estão limitados a 650 cavalos de potência. Na temporada 2009, eles vão ganhar uma forcinha extra. Assim como outras escuderias, a Ferrari está desenvolvimento um sistema de recuperação de energia cinética. Ele reaproveita a energia gerada na frenagem. É a mesma tecnologia empregada por montadoras em carros híbridos. Mas ao contrário desses modelos, em que isso gera economia de combustível, na F1 essa energia armazenada em uma bateria de íon-lítio será usada em uma aceleração mais potente com o apertar de um botão no volante. Esse aparato extra não deve afetar a performance do carro, já que o conjunto pesa menos de 50 quilos. Mas há limites: o motor poderá tem apenas 100 cavalos a mais e só por 6,66 segundos a cada volta. “Mesmo assim, já é uma ajuda substancial”, diz Gundel.
O novo regulamento impede a equipe de alterar o carro a partir do box, como era feito antes. Isso exige que Massa tenha certo domínio das tecnologias do modelo. "Se o engenheiro pedir para fazer algo, eu tenho de saber do que ele está falando", diz ele. Em sua segunda temporada na F1, o brasileiro considera a categoria a mais tecnológica de todas. Mesmo assim, ele não precisa se dedicar a manuais complexos e a aulas sobre componentes: "Meu curso é o treino e a reunião com a equipe".
Nem toda a equipe Ferrari estará em Interlagos no domingo. Engenheiros acompanham a corrida em tempo real a partir de Maranello e fazem suas próprias análises. "É como uma garagem virtual", diz Gundel. "A vantagem é que algumas pessoas não precisam estar aqui". Mas ainda é a equipe presente no local que avalia problemas no carro, porque estão ali para fazer os acertos manualmente. Também é a partir do box que estratégias são traçadas. Perder a conexão com a Itália poderia custar pontos preciosos. No domingo, o preço poderia ser o campeonato.
É possível imaginar que a evolução dos computadores e de sua capacidade de processamento poderia levar a Ferrari a fazer as mesma quantidade de análises de forma mais rápida. Não é bem assim. "Analisamos mais no mesmo tempo e descobrimos mais sobre a performance", diz o diretor de tecnologia. "Espero que isso nos ajude a formular estratégias que nos tornem mais rápidos na corrida". A torcida brasileira também, Gundel, a torcida brasileira também.
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