Fé e Deus nas eleições dos EUA

Rogério Simões

presidente Goerge W. Bush consolidou a associação de líderes conservadores americanos com Deus. "Quanto mais tempo passamos com Deus, mais nós vemos que Ele não é um rei distante, mas um amoroso pai", disse Bush durante um discurso. Se as urnas reproduzirem o que dizem as mais recentes pesquisas de opinião, os Estados Unidos em breve mudarão de rumo, seguindo um caminho mais liberal, voltando ao comando democrata. Mas, se o senador Barack Obama for eleito presidente no próximo dia 4, a inspiração divina continuará na Casa Branca, como ele já deixou claro ao longo de sua campanha. "Eu quero que vocês orem para que eu possa ser um instrumento de Deus", afirmou Obama em um encontro com seguidores.

As falas acima aparecem em um documentário da BBC que lança uma luz sobre o atual estado da superpotência mundial, a partir de uma perspectiva histórica. O historiador britânico Simon Schama, professor da Universidade de Columbia, em Nova York, analisou, entre outros temas, o papel da religião na formação e no desenvolvimento da nação americana. Na série para a TV, "The American Future: A History" (O Futuro Americano: uma História), exibida dias atrás aqui na Grã-Bretanha, Schama mostrou em um dos episódios como a religião, e especialmente o exercício da liberdade religiosa, é central na história dos Estados Unidos. Afinal, os pioneiros que cruzaram o Atlântico buscavam construir comunidades onde pudessem orar da forma que quisessem, liberdade garantida no Estatuto da Liberdade Religiosa da Virgínia, elaborado por Thomas Jefferson.

Esse aspecto da história americana é explorado de forma didática e inteligente por Schama, que em seguida traz para a realidade atual a importância da fé em Deus. "Cristãos evangélicos suspeitam que o candidato republicano, John McCain, não seja exatamente seu homem", diz o historiador. "Desta vez, é o candidato democrata, Barack Obama, quem invoca a fé como sua inspiração."

A fé de Obama quase o colocou em apuros meses atrás, quando sua associação com o reverendo Jeremiah Wright, seu ex-pastor em uma igreja da comunidade negra de Chicago, foi explorada na disputa pela indicação democrata. Wright, em seus sermões incendiários, atacava a nação e o ex-presidente Bill Clinton. Dizia que os Estados Unidos praticavam terrorismo no exterior e falava em uma "América branca". Barack Obama viu-se forçado a responder e o fez em um discurso que se tornou histórico e ficou conhecido como o "discurso sobre raça". No pronunciamento, Obama atacou de frente a questão racial no país e criticou as declarações do seu ex-pastor. Mas também falou da importância de Wright para sua formação moral e do papel da religião na sua vida. "O homem que eu conheci há mais de 20 anos é um homem que ajudou a me apresentar para a fé cristã, que falou para mim das obrigações de amarmos uns aos outros, de cuidar dos enfermos e ajudar os pobres." Barack Obama diz ser um homem de Deus, e a fé tem sido central na sua tentativa de se tornar o primeiro negro na Casa Branca.

O republicano John McCain raramente fala de Deus ou de religião. Ele freqüenta a igreja, mas não tem a fé como uma de suas armas políticas. Sua candidata a vice, Sarah Palin, é amada por religiosos conservadores, mas sua presença na chapa não foi suficiente para dar um toque evangélico na campanha republicana. Após oito anos de Bush clamando ter o Criador ao seu lado, divulgando a partir de Washington uma versão conservadora de religião, apoiado numa aliança da direita cristã com conservadores judeus, a inspiração divina nos Estados Unidos agora é outra. Nesta eleição Deus parece estar do lado democrata.

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