Cinema: 'Nine' tem 'n' razões para o sucesso, mas também flerta com o fracasso

Musical de Rob Marshall reúne Kidman, Cruz, Cotillard e até Sophia Loren. Filme que estreia sexta brigou por 5 Globos de Ouro e não levou nenhum.

'N' eram as chances de dar certo a aposta do cineasta Rob Marshall (de "Chicago") em "Nine". O filme é baseado em um musical de sucesso da Broadway, tem roteiro assinado por Michael Tolkin e Anthony Minghella, orçamento de US$ 80 milhões e um time de estrelas que vai de Nicole Kidman e Penélope Cruz a Sophia Loren e Judi Dench passando por Marion Cotillard, Kate Hudson e Fergie. Sem falar no galã escolhido a dedo, Daniel Day-Lewis.

Inspirado no filme “8 ½”, do diretor italiano Federico Fellini (1920-1993), “Nine”, que estreiou sexta-feira (29) no Brasil, conta a história de Guido Contini, um cineasta que contabiliza alguns filmes de sucesso, outros fracassos, e se vê diante de um bloqueio criativo justamente quando tem que dar início à produção do que será seu novo longa-metragem.

Figurinistas e cenógrafos trabalham a todo vapor. A imprensa é chamada para divulgar a nova produção. Até a atriz, célebre musa inspiradora do diretor, já está reservada. Tudo exatamente como planejado não fosse um pequeno detalhe: ninguém jamais viu o roteiro do filme, justamente porque Guido mal começou a escrevê-lo.

Em seus devaneios tentando criar sua nova "obra-prima", ele reúne em números musicais (e normalmente em trajes sensuais) as mulheres que fizeram e ainda fazem parte de sua vida. Uma a uma, as beldades hollywoodianas dançam, cantam, rebolam, revelam a boa forma e declaram seu amor incondicional por Guido, em performances que se revezam entre gloriosas e constrangedoras.


Flertes com o fracasso

Quase nada podia dar errado para "Nine"... mas deu. O musical segue no páreo pelo Oscar, como um dos mais comentados do ano e aguardando um bom número de indicações - a serem divulgadas na próxima terça-feira (2). No Globo de Ouro, entretanto, um dos principais termômetros para a festa da Academia, o longa disputava em cinco categorias, entre elas a de melhor filme musical ou comédia, e não levou absolutamente nenhuma estatueta.

Assim como os correspondentes internacionais em Hollywood, que votam no Globo de Ouro, também os jornalistas norte-americanos não foram tão simpáticos ao longa. O jornal "Los Angeles Times" escreveu: "Já que 'Nine' é um musical, ajudaria se o protagonista masculino soubesse cantar. (...) Daniel Day-Lewis não é um homem de cantar e dançar. Então, o que resta para 'Nine'? Não muito".

Day-Lewis também foi criticado pelo "The New York Times", que lembra que o personagem principal de “8 ½”, que muitos dizem ser inspirado no próprio Fellini, tinha mais profundidade do que seu correspondente no filme de Marshall. "O medo do vazio é o que anima o personagem de Guido, vivido por Marcello Mastroianni em '8 ½', um homem cuja vaidade, ternura e narcisismo, e cuja ansiedade diante da chance de falhar como artista e homem faz dele um herói vivo e crível. Essa dimensão psicológica falta a 'Nine'."

Saiba quem é quem no elenco de 'Nine'

Estreiou em 29 de janeiro, nos cinemas do país o musical "Nine". O filme é baseado em um espetáculo de sucesso da Broadway e inspirado em "8 1/2", clássico do cineasta italiano Federico Fellini. O elenco estrelado é um caso à parte. O G1 participou de entrevistas com os oito atores e o diretor do filme em Los Angeles. Confira a seguir o que eles disseram sobre seus personagens:


DANIEL DAY-LEWIS – GUIDO, O CINEASTA EM CRISE
(Musical “Guido’s song”)


Guido Contini: cineasta italiano famoso por filmes de sucesso - e alguns nem tão bem-sucedidos assim. Namorador e sedutor incorrigível, tem o hábito de flertar com as atrizes de seus filmes.

“Quando Rob me procurou para falar sobre a possibilidade de trabalhar com ele no filme, tive a mesma sensação que provavelmente os outros atores envolvidos neste projeto: um tremendo desejo de tentar esse desafio. Ao mesmo tempo, tive esse medo paralisante que vem de você tentar se expressar como ator de uma maneira que é completamente diferente de sua referência normal. Tentar isso e me encontrar por meio da música foi um imenso desafio. Eu não entendia muito como usar a intepretação falada por meio da música. A gente meio que faz um papel de idiota no primeiro dia, o que é totalmente compreensível quando você não está seguro das coisas."

MARION COTILLARD - LUISA, A ESPOSA DEDICADA
(Musical “My husband makes movies” e “Take it all”)

Luisa Contini: estrela dos filmes de Guido, largou tudo para ficar ao lado dele e se dedicar ao casamento. É frequentemente traída pelo marido, sedutor incorrigível, que mantém amantes e não lhe dá a mínima

"Ela não é uma mulher frágil. Está sofrendo muito e mostrando a ele como é duro sofrer. Sim, ela pode ser sexy. Na verdade, ela pode ser várias coisas porque é também uma atriz e só quer ser respeitada. Foi interessante fazer uma personagem que demonstra tantas facetas e, em particular, ver esta mulher, elegante, bonita e inteligente se transformar da maneira que o fez por não mais suportar o sofrimento.”

PENÉLOPE CRUZ – CARLA, A AMANTE SEDUTORA
(Musical “A call from the Vatican”)

Carla: também é casada, mas não titubeia em largar tudo para ir ao encontro de Guido quando ele sofre com bloqueio criativo. Hospedada em uma pousada de quinta categoria, acaba tendo de se esconder quando a mulher do cineasta aparece.

“Não houve um momento enfadonho durante o filme. Foi também extremamente desafiador. Estaria mentindo se dissesse que os números musicais foram fáceis, mas tivemos ótimos professores e muito tempo para os ensaios. Quando fiz o meu número musical, tive a sensação de estar voando. Tinha de ser erguida por cordas numa altura de 40 metros. Foi uma das coisas mais desafiadoras para mim. E, depois de meses de ensaio, quando finalmente eu estava no controle, tive uma surpresa: eu não sabia que ia dançar no escuro. Meu coração bateu mais forte por quase dois dias."


NICOLE KIDMAN – CLAUDIA, A MUSA INSPIRADORA
(Musical “Unusual way”)

Claudia: É a atriz conhecida como musa inspiradora de Guido. Estrela maior de suas produções, pressiona o cineasta quando as filmagens de seu novo trabalho começam, e ela não recebe o aguardado roteiro

"Minha personagem, por estar nos anos 60s, é pouco diva. Mas ela tem uma questão interessante com Guido. A música que canto para ele fala muito sobre como ele não me conhece de verdade. Nos amamos, mas de um modo criativo, e é assim que deve permanecer, sempre no módulo diretor-atriz-musa. Gostei disso. É como o relacionamento de Pedro Almodóvar e Penélope Cruz: eles têm um caso que existe apenas como um amor criativo e fazem grandes projetos juntos."

JUDI DENCH – LILLI, A FIGURINISTA PROTETORA E CONFIDENTE DE GUIDO
(Musical “Folies Bergere”)


Lilli: figurinista dos filmes de Guido, é antes de tudo sua amiga e conselheira, a quem ele sempre recorre quando precisa de um consolo

“Quando começamos os ensaios, eu tentava cantar, depois fazia um pouco da coreografia, até que, de repente, chegou o dia de fazer as duas coisas juntas. E, nesse dia em que fizemos o ensaio completo, o Rob virou e disse: 'olha, a Sophia Loren chegou' (risos). O Daniel veio e a gente ficou por uma meia hora dando as boas vindas ou simplesmente maravilhados por ela estar lá. Eu tive que subir no palco do teatro e, olhando para a plateia, lá estavam Daniel e Sofia na segunda fileira. Aquele momento para mim não poderia ter se tornado mais amedrontador."

KATE HUDSON – STEPHANIE, REPORTER SEDUTORA
(Musical “Cinema italiano)

Stephanie: repórter da revista 'Vogue', vive um jogo de sedução com Guido.

“Quando recebi o CD com as músicas fiquei bastante nervosa ao descobrir que a canção que eu interpretaria era original. Lembro de ouvir pela primeira vez o som da bateria, era bem rápido, como música latina. Não era exatamente o que eu esperava cantar. Fiquei pensando se daria conta de cantar rápido e, ao mesmo tempo, articular todas aquelas palavras. Mas apesar de intensa, foi uma experiência maravilhosa. Rob e eu conversamos sobre fazer o número em estilo go-go, que seria uma representação do final dos anos 60, começo dos 70, com um certo abandono, sem cuidado, as roupas e o cabelo certos. E eu me joguei completamente.”

SOPHIA LOREN – MAMA
(Musical “Guarda la luna”)

Mãe: uma das mulheres mais importantes na vida de Guido, a mãe aparece sempre para resgatar a memória afetiva do filho e ponderar sobre seus relacionamentos com as mulheres.

“Um dia recebi uma ligação do Rob Marshall dizendo que ia fazer um musical e que tinha um papel para mim: a mãe de um personagem inspirado em Federico Fellini. Fiquei bastante lisonjeada pelo convite porque me daria uma oportunidade de ficar mais próxima de Fellini, coisa que nunca aconteceu quando ele era vivo. Sempre quis fazer um filme com Fellini. De fato, chegamos bem perto, mas, no final, não aconteceu. E também tem o fato de ser um musical. Eu adoro música. Gosto de cantar. Todo napolitano canta."


STACY ‘FERGIE’ FERGUSON – SARAGHINA, A PROSTITUTA
(Musical “Be Italian)

Saraghina: a prostituta foi a primeira mulher de Guido, que, ainda na infância, juntava dinheiro com os amigos para vê-la nua.

“Ganhar peso foi fácil (risos). Comi coisas que não comia há muito tempo, como donuts, batatas e peixe frito. E olha que sou fiel à academia, mas nesse período não quis malhar muito para não perder nada do peso adquirido. Os ensaios já bastavam. Eu queria ser fiel à personagem, e o que foi interessante foi sentir a Saraghina gostando do seu corpo. Ela gosta de suas curvas, e os garotos também gostam."

ROB MARSHALL – O DIRETOR

Rob Marshall: experiente diretor de teatro e coreógrafo, Marshall, 49, só estreou no cinema em 2002, com a adaptação de 'Chicago', que lhe rendeu uma indicação ao Oscar. Em 2005 lançou 'Memórias de uma gueixa'. Vai dirigir o próximo longa da franquia 'Piratas do Caribe', que deve estrear em 2011

“Fellini é uma inspiração para todos os cineastas e foi extremamente difícil tentar criar um trabalho a partir de um filme dele, especialmente porque 'Oito 1/2' é uma obra-prima. A única maneira de me focar na criação de 'Nine' foi distanciando-me um pouco do filme original. Desafiei-me a encontrar uma outra maneira de contar a história, que não é linear, nem uma narrativa clássica. A beleza no trabalho de Fellini é que ele criou filmes tão incríveis, que conseguem transitar entre fantasia, realidade e lembranças. Ao traduzir isso para o gênero musical você ganha uma cadência, tudo flui mais glorioso."


Fontes: G1 - TV Globo / Débora Miranda e Paoula Aboul-Jaoude.

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