G-20: O ajuste em discussão

Celso Ming

Lá estão eles, os 20 chefes de Estado mais importantes do mundo, reunidos em Seul, na Coreia do Sul, em busca de um mínimo de governança para uma economia cada vez mais globalizada e cada vez mais desequilibrada.

A maioria desses desequilíbrios se manifesta como rombos nas contas externas. São países que têm sobras nas suas relações com outros países (superávits em conta corrente) e que têm como contrapartida rombos externos (déficits em conta corrente). Os com mais sobras são China, Alemanha e Japão. O mais deficitário são, de longe, os Estados Unidos.

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Obama. Bom para quem? (Foto: Ahn Young-joon/Reuters)

Cavoucando um pouco mais, vê-se que esses déficits são causados por forte consumo, que puxa importações e despesas no exterior. Estas, por sua vez, são acionadas pelo aumento da renda e do poder aquisitivo causado por enormes despesas públicas. Ou seja, por trás dos rombos externos geralmente estão os rombos orçamentários (veja tabela).

Os rombos orçamentários são cobertos com dívidas (emissão de títulos públicos). Não por coincidência, os maiores compradores dos títulos das economias ricas são países com forte superávit externo (China e Japão), que amontoam reservas com os dólares que têm em excesso.

Nesses termos, o ajuste adequado teria de ser feito por meio de contenção das despesas públicas e da redução das dívidas dos países ricos. Como isso exige sacrifício, recessão, desemprego e tanta coisa de difícil execução, os Estados Unidos estão recorrendo a mecanismos de expansão monetária que implicam desvalorização do dólar e do yuan, atrelado ao dólar.

Esses mecanismos de efeito mais contundente estão sendo acionados pelo Fed (o banco central dos Estados Unidos). Depois de ter expandido o volume de moeda na economia a níveis tão elevados a ponto de seu preço (juros) ficar próximo de zero por cento ao ano, o Fed está recorrendo a um instrumento extremo, o afrouxamento quantitativo, que é a recompra de títulos públicos com emissão de dólares.

O objetivo declarado é produzir pontes de safena que desbloqueiem o crédito, o consumo, a produção e o emprego. É a execução de política monetária por outros meios para tentar o ajuste que deveria ser produzido pela política fiscal.

Se haverá o resultado desejado é o que ainda se vai ver. O problema é que essa gambiarra produz grave efeito secundário, que é a inundação de dólares nos demais países e desvalorização cambial. Assim formatado, o ajuste transfere para o resto do mundo a conta da crise, que é fundamentalmente dos Estados Unidos.

Em nenhum momento, os chefes de Estado do G-20 tentaram discutir em Seul consertos na área fiscal, tecnicamente os mais apropriados, mas politicamente quase inviáveis. O principal conflito de interesses do momento é, de um lado, a defesa dessa política monetária dos Estados Unidos pelos seus dirigentes e, de outro, os ataques a ela por parte da China, Alemanha, França e Brasil.

O presidente americano, Barack Obama, lembrou que “o que é bom para os Estados Unidos é bom para o mundo”. É uma variação da velha frase do secretário da Defesa dos Estados Unidos nos anos 50, Charles Wilson, para quem “o que é bom para a General Motors é bom para os Estados Unidos”.

Obama quer dizer que os Estados Unidos ainda são a locomotiva do mundo. Se continuarem estagnados, todos os demais vagões também permanecerão. O Japão e a Inglaterra estão de acordo com isso. Nesta quinta, quando disse que “sem demanda dos países ricos, o mundo vai à falência”, Lula também pareceu ter abraçado a tese de Obama.

A tendência é a de que nada conseguirá deter o Fed de prosseguir na sua política monetária expansionista. O governo americano não nega os efeitos perversos sobre o câmbio dos países emergentes, mas parece dizer: “Aguentem um pouco, que depois melhora.”

É esperar para ver o que sai daí.

O panorama do G-20




Fonte: O ESTADO DE S PAULO

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