Analistas afastam hipótese de golpe contra Rafael Correa no Equador

Seria rebelião policial e não golpe de estado

Apesar do caos que tomou conta das cidades equatorianas nesta quinta-feira (30), com aeroportos, quartéis e estradas tomadas por militares e policiais, analistas entrevistados pelo UOL Notícias afastam a hipótese de ocorrer um golpe contra o atual governo de Rafael Correa. Os militares protestam contra uma lei do governo que reduz benefícios para a categoria.

“Estive no Equador em julho para fazer uma pesquisa com vários segmentos da sociedade e não senti qualquer possibilidade de golpe. A situação institucional ainda é frágil, mas agora, com o Rafael Correa, há mais estabilidade”, afirma Pedro Silva Barros, titular da representação do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada).

Para Barros, os militares insatisfeitos com o governo não têm base de apoio dentro e fora do país. “Eles não têm o menor apoio internacional. Ninguém vai aceitar esse tipo de coisa. São protestos por insatisfação salarial, um assunto corporativo. Não teriam condições de sustentar um golpe”, diz.

Já Leonardo Valente, professor de Relações Internacionais e Geopolítica da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), afirma que é cedo para dizer o que vai acontecer, mas acredita que os confrontos de hoje não tem força para abalar a base de sustentação do governo.

“Até que o Correa assumisse a Presidência, o Equador era o país mais volátil do continente. A queda de presidentes era algo muito frequente. Isso foi contornado. Correa conseguiu costurar uma estabilidade e uma base de apoio que tornou mais difícil que as situações do passado voltem a ocorrer. Porém, ainda é muito cedo para avaliar”, diz.

Morte cruzada

A tensão começou a se agravar hoje quando um grupo de militares aeroporto internacional de Quito, no Equador, e uma base área militar na capital do país, e por isso foram suspensas as operações aéreas. Para amenizar o caso, Correa foi até o Quartel de Quito discursar aos manifestantes, mas acabou ferido por uma bomba de gás lacrimogêneo. O hospital para onde o presidente foi levado foi cercado por militares.

Para amenizar a tensão, Correa já havia sinalizado com a hipótese de adotar a “morte cruzada”, um dispositivo na Constituição equatoriana que permite a dissolução do Congresso e a convocação das eleições gerais, inclusive para presidente. Parte da oposição, inclusive, defende essa medida. “Isso é um recurso antigo, já foi feito várias vezes nos últimos anos e que faria voltar a instabilidade institucional de antes”, afirma Valente.

Unasul e economia

Os analistas acreditam que o fortalecimento da relação entre os países sul-americanos, materializado na Unasul, poderá ser fundamental para impedir um golpe no Equador. “É um fator que pesa [contra o golpe]. Um exemplo é a Bolívia, quando todos os departamentos da meia-lua se rebelaram e poderiam ser desencadeados fatos políticos graves, como a queda do governo ou uma guerra-civil. Na época, a Unasul deu um recado claro, que o governo de Evo Morales era democraticamente legítimo e que um golpe não seria aceito”, afirma o professor da UFRJ.

Para Valente, Rafael Correa melhorou a situação econômica e social do Equador, mas os problemas na macroeconomia atrapalharam o andamento de seu governo nos últimos dois anos. “Ele trabalhou para aumentar a participação do Estado na economia e depois implantou políticas assistencialistas para a população mais pobre. Isso funcionou num primeiro momento, mas questões macroeconômicas impediram que ele conseguisse mais avanços.”

De acordo com o acadêmico, a lei polêmica que gerou revolta entre os militares e policiais pode ter sido aprovada por conta da falta de recursos no caixa do governo. “Os gastos com política do Estado aumentaram, e a situação internacional não está favorecendo. Houve uma queda na receita”, analisa.

“A situação econômica do Equador melhorou. Ainda que o país tenha sofrido nos últimos anos, a economia melhorou. Está bem melhor do que na época da pré-dolarização e no pós-dolarização”, aponta Pedro Silva Barros.

Base de apoio

“O problema maior é que Correa foi eleito com apoio dos movimentos sociais, indígenas, da esquerda e de ambientalistas, mas conforme o passar dos anos ele foi deixando esses grupos de lado e vice-versa. Isso enfraqueceu o governo”, diz o pesquisador do Ipea.

Já Valente acredita que esse suposto descolamento da base pode favorecer um descontentamento geral e aumentar a possibilidade de golpe. “A base equatoriana está muito acostumada com mobilização quando está insatisfeita. Eles possuem sindicatos, organizações indígenas e associações corporativas ativas politicamente. Quando estão descontentes, vão para a rua”, afirma.

Fonte: UOL/Guilherme Balza

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