Haiti: Na ''cozinha do inferno'', a decadência é evidente

Em feira da capital, haitianos comem em meio à sujeira

Maior feira de comidas de Porto Príncipe expõe a tragédia do terremoto, da fome e da miséria da capital do Haiti.

O tremor que destruiu a cidade no dia 12 deixou vendedores da "cozinha do inferno" - apelido do mercado entre as tropas brasileiras - desabrigados e sem filhos.

À espera das distribuições de alimentos pelas Nações Unidas, outros haitianos procuram a feira para apanhar restos de comida em vez de comprá-la. Não há nenhum controle de higiene. Os alimentos são preparados em meio a milhares de moscas varejeiras, cheiro de podridão, lixo, comida estragada no chão, gatos e cachorros.

O Estado visitou ontem a "cozinha do inferno", por onde circulam 3 mil pessoas diariamente. Na chegada, a reportagem assistiu ao menino Billy, de 12 anos, pegando no chão laranjas podres para chupá-las logo depois. Mais à frente, dentro da feira, Poline, de 40 anos, vendia pedaços de porcos crus, que servem de descanso para milhares de moscas a céu aberto. Ela perdeu a casa e os três filhos com o terremoto que desabrigou 1,5 milhão de pessoas em Porto Príncipe. Vive na rua desde o tremor. "Eu estava aqui trabalhando e, quando voltei para casa, os três estavam mortos", contou.

Ao perceber a presença do fotógrafo, ela usou um pedaço de papelão para espantar as moscas. O guia da reportagem, Johnson, de 18 anos, disse que é normal a venda de carnes em meio a tanta sujeira. "Não faz mal, a gente põe óleo, cebola e fica show", afirmou.

Outra vendedora, Cristian, de 40 anos, ainda não conseguiu retirar dos escombros dois dos quatro filhos. Na tarde de ontem, vendia pastéis de ovo a menos de US$ 1, um limite de preço para quase todas as comidas vendidas na feira. Por essa faixa, Sara, de 33 anos, vende pratos de repolho, peixe e salsicha. A sujeira é visível nos pratos, nas comidas e no material usado no preparo.

Ela é outra desabrigada. Assim como Annuse, de 32 anos, que perdeu o filho no terremoto e hoje tenta vender laranja no mercado. Ontem, reclamava do aumento dos preços das frutas, compradas nos arredores de Porto Príncipe e na cidade de Cap-Haitien, ao norte do país. "Houve aumento de até 10%", disse.

Nas vielas do mercado, variedades: sopa, banana, batata, bolo de farinha, tudo preparado sem qualquer cuidado e encalhado por falta de compradores. A sopa preparada por Marlise, de 40 anos, começava a esfriar enquanto ela preparava bolos de farinha, algo parecido com a tapioca.

Um gato branco descansava ao lado da bacia suja usada como depósito da comida. Rosemarie, de 50 anos, que perdeu a casa e vive na rua, ofereceu algo semelhante a um pão sírio, mas preparado com farinha de mandioca. As moscas varejeiras dominaram o alimento. Mesmo assim, o motorista do Estado, Janja, comeu um pedaço.

Fonte: O ESTADO

Nenhum comentário:

LinkWithin

Related Posts with Thumbnails