Toffoli pode enfrentar sabatina dramática

Toffoli enfrentará resistências


Existência de condenação contra o Advogado-Geral da União representa uma pedra num caminho onde as indicações costumam ser referendadas num ambiente de monotonia e submissão ao Executivo.

Indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para ocupar uma vaga no Supremo Tribunal Federal, o Advogado-Geral da União José Antonio Dias Toffoli corre o risco de enfrentar uma sabatina dramática como o Senado brasileiro jamais ofereceu a seus antecessores.

A revelação de que no dia 8 de setembro – uma semana antes de Lula confirmar a indicação -- Toffoli foi condenado a devolver R$ 420 000 reais ao Estado do Amapá, referentes a remuneração por um “contrato ilegal”, conforme o juiz que assinou a sentença, representa uma pedra num caminho onde as indicações costumam ser referendadas num ambiente de monotonia e submissão ao Executivo.

A discussão, na realidade, é mais política do que jurídica. Época apurou que, se depender da opinião de uma parte do plenário do STF, onde Toffoli irá sentar-se caso seu nome venha a ser aprovado, o caso tem menos relevância do que parece.

Em primeiro lugar, porque ele foi condenado em primeira instância. “Para um magistrado, uma pessoa só pode ser considerada condenada definitivamente depois que todos os seus recursos foram examinados, em todas as instâncias,” diz um ministro, sob a condição de ter seu nome mantido sob reserva. Outro ministro disse a Época que considera o caso “tão irrelevante” que nem deveria ter chegado à mídia.

Toffoli foi condenado no interior de uma guerra política do Amapá, envolvendo dois ex-governadores, Annibal Barcellos e João Capiberibe. O caso é do início da década. Adversário de Capiberibe, Anibal Barcelos entrou com uma ação popular contra o rival, acusando-o de contratar os serviços de um escritório que Toffoli mantinha no início da década -- sem passar por um processo devido de licitação. Em vez de realizar uma concorrência padronizada, dentro das regras definidas em lei, Capiberibe contratou o escritório depois de ouvir o procurador-geral do Estado. Foi essa a acusação aceita pelo juiz Mario Cezar Kaskelis, de Macapá, que em sua sentença descreveu o ritual como um “conluio.”

Outra acusação é que os serviços prestados pelo escritório de Toffoli eram fictícios – ou seja, ele ganhava sem trabalhar. O atual advogado-geral da União reuniu duas testemunhas capazes de sustentar que ele cumpria as funções pelas quais era remunerado. Uma delas é o ministro da Defesa, Nelson Jobim, ex-integrante do Supremo. Num lance até agora pouco explicado do processo, o juiz Mario Cezar Kaskelis lavrou a sentença antes que as duas testemunhas fossem ouvidas.

O debate real envolve a licitação, porém. Pela legislação em vigor, as licitações são obrigatórias. Mas há uma brecha na lei, os casos de “notória especialização.”
“Essa discussão é antiga. Nós temos uma posição consolidada de que esse tipo de contratação não é irregular,” diz Cezar Brito, presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), entrevistado por Época. “A contratação de um advogado sempre envolve a confiança do cliente,” lembra o presidente da OAB.

Essa convicção é tão profunda que nos últimos anos a Ordem tem feito atos de desagravo em defesa de advogados envolvidos em processos semelhantes, onde são acusados de prestar serviços a governos de Estado sem passar por uma licitação. Conforme Cezar Brito, “a experiência demonstra que a contratação desses escritórios particulares é boa para o Erário. Ele tem muito mais chance de ganhar uma causa do que os procuradores do Estado.”

A discussão é política, porém. Embora não fosse condenado, o atual presidente do STF, Gilmar Mendes, respondia a processo de improbidade administrativa quando seu nome foi submetido à sabatina do Senado. O fato de ter recebido uma condenação, mesmo em primeira instância, representa um agravante para Toffoli, num momento em que um milhão de pessoas assinaram um abaixo-assinado contra os políticos de ficha suja – e os senadores de oposição estão à caça de uma tribuna para atacar o governo, depois que a CPI da Petrobrás murchou e as denuncias contra José Sarney foram encerradas.

Conforme um juiz ouvido por Época, a lei exige que, para integrar o Supremo, um candidato seja uma pessoa de “reputação ilibada,” expressão subjetiva, que permite muitas interpretações. “É uma exigência ampla,” explica este magistrado. “Reputação é fama. Não basta a pessoa ser inocente. Ela precisa ter fama de inocente. Será que uma pessoa condenada em primeira instância, por mais tumultuado que tenha sido o processo, cumpre essa exigência?”

Nos últimos dias, o próprio Toffoli informou à liderança do Senado, que irá sabatiná-lo, sobre a existência desta ação na Justiça. Também comunicou sobre a condenação.

Na manhã de hoje, quando a revelação chegou à mídia, Toffoli deixou claro que não enxerga a mais leve possibilidade de que essa descoberta possa representar uma mudança em seus planos para chegar ao Supremo.

Fonte: Revista Época/Marcelo Rocha e Matheus Leitão


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