Na ONU, chanceler diz ver indícios de plano para invadir embaixada

Amorim denuncia planos de ataque à embaixada

O chanceler Celso Amorim disse nesta sexta-feira, no discurso ao Conselho de Segurança da ONU, em Nova York, que o Brasil está "profundamente preocupado" com a hipótese de que o governo interino de Honduras "venha a ameaçar a inviolabilidade da embaixada [brasileira em Tegucigalpa] para prender o presidente [deposto Manuel] Zelaya à força". "Isso não é uma mera suspeita. Recebemos indícios concretos sobre essa possibilidade", disse o chanceler.



Em seu discurso, Amorim revelou que um oficial de Justiça hondurenho esteve na embaixada "munido de um mandado de busca" para tentar entrar no prédio, mas que "evidentemente, os funcionários brasileiros recusaram-se a receber o mandado e não permitiram a entrada" dele.

Outro ponto que indicaria a ameaça à inviolabilidade da embaixada, para Amorim, seria uma mudança no tratamento formal concedido à instituição, na tentativa de demonstrar que ela já não possui status diplomático. "O governo de facto enviou uma comunicação diretamente ao Ministério das Relações Exteriores na qual se refere à embaixada como 'uma das instalações que o governo brasileiro ainda mantém em Tegucigalpa'", denunciou Amorim.

O chanceler destacou ainda comunicado publicado nesta quinta-feira (24) pela Secretaria de Relações Exteriores de Honduras que afirma ter havido "evidente intromissão" do Brasil "nos assuntos internos" do país na acolhida de Zelaya e, por isso, atribui ao país responsabilidade não apenas pela segurança de Zelaya como pela de todas as pessoas envolvidas no caso e de todas as propriedades dos arredores da embaixada.

"Tais atos violam totalmente a Convenção de Viena e, mais imediatamente, a recente decisão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos pela qual o governo de facto de Honduras não poderá ameaçar a segurança do presidente Zelaya e de todos abrigados na embaixada do Brasil", argumentou Amorim.

Pelo 22º artigo da Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas, de 1961, estabelece que locais das missões diplomáticas (embaixadas e edifícios anexos) são invioláveis, e os agentes do Estado acreditado (que recebe a embaixada) não podem entrar sem consentimento.

Nesta sexta-feira, Zelaya e funcionários da embaixada denunciaram a presença de um gás tóxico no local. Dois médicos hondurenhos entraram na embaixada para examinar o presidente deposto e outras pessoas abrigadas no prédio que supostamente foram afetadas pelo gás.

Os médicos atenderam Zelaya, que mostrou sinais de irritação na garganta, e outras pessoas abrigadas na embaixada que disseram ter sido atingidas por um gás, que, segundo o presidente deposto, foi lançada por soldados nesta sexta-feira. Os soldados negaram a acusação.

Zelaya disse que o gás tóxico levou muitas pessoas a vomitar sangue e apresentar outros problemas respiratórios, tonturas e problemas digestivos.

Dois funcionários da embaixada que permanecem no prédio com o presidente deposto informaram à estatal Empresa Brasil de Comunicação (EBC) que havia cheiro de gás e pessoas passando mal na sede diplomática.


Chanceler Amorim concede entrevistas depois de falar ao Conselho de Segurança da ONU em Nova York

Abusos

Na ONU, Amorim também denunciou a má situação da embaixada e das cerca de 70 pessoas --incluindo Zelaya, a família dele, apoiadores e funcionários da missão brasileira-- que estão lá devido ao cerco hondurenho. Ao final, ele conseguiu que o Conselho de Segurança pedisse ao governo interino hondurenho que pusesse fim ao cerco.

"Desde o dia em que abrigou o presidente Zelaya em suas instalações, a embaixada brasileira tem estado cercada. Tem sido submetida a atos de assédio e intimidação pelas autoridades de facto. O fornecimento de água e eletricidade foi interrompido, e as linhas de telefone foram cortadas. As comunicações por meio de telefones celulares foram bloqueadas. Equipamentos que emitem sons perturbadores foram instalados em frente à embaixada", relatou.

O chanceler informou ainda que o "acesso a alimentos foi severamente restringido" e que a "circulação de veículos oficiais da embaixada foi impedida".

Ele contou que o encarregado de negócios da embaixada, o diplomata Francisco Catunda, não pode ir da embaixada para sua casa, em Tegucigalpa, porque os militares hondurenhos não permitem o retorno de qualquer um que deixe a área da embaixada. Amorim diz que foi isso que aconteceu à mulher do próprio Catunda.

Histórico

Zelaya voltou a Honduras quase três meses depois de ser expulso. Nas primeiras horas do dia 28 de junho, dia em que pretendia realizar uma consulta popular sobre mudanças constitucionais que havia sido considerada ilegal pela Justiça, ele foi detido por militares, com apoio da Suprema Corte e do Congresso, sob a alegação de que visava a infringir a Constituição ao tentar passar por cima da cláusula pétrea que impede reeleições no país.

O presidente deposto, cujo mandato termina no início do próximo ano, nega que pretendesse continuar no poder e se apoia na rejeição internacional ao que é amplamente considerado um golpe de Estado --e no auxílio financeiro, político e logístico do presidente venezuelano, Hugo Chávez-- para desafiar a autoridade do presidente interino e retomar o poder.

Isolado internacionalmente, o presidente interino resiste à pressão externa para que Zelaya seja restituído e governa um país aparentemente dividido em relação à destituição, mas com uma elite política e militar --além da cúpula da Igreja Católica-- unida em torno da interpretação de que houve uma sucessão legítima de poder e de que a Presidência será passada de Micheletti apenas ao presidente eleito em novembro. As eleições estavam marcadas antes da deposição, e nem o presidente interino nem o deposto são candidatos.

Mas o retorno de Zelaya aumentou a pressão internacional sobre o governo interino, alimentou uma onda de protestos que desafiaram um toque de recolher nacional e fez da crise hondurenha um dos temas da Assembleia Geral da ONU (Organização das Nações Unidas), reunida em Nova York esta semana. A ONU suspendeu um acordo de cooperação com o tribunal eleitoral hondurenho e a OEA planeja a viagem de uma delegação diplomática a Honduras para tentar negociar uma saída para o impasse.

Pelo menos duas pessoas morreram em manifestações de simpatizantes de Zelaya reprimidas pelas forças de segurança durante um toque de recolher que foi suspenso nesta manhã. Nesta quinta-feira, houve novas marchas em favor do presidente deposto, mas também manifestações favoráveis ao governo interino.


Fonte: FOLHA

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