Congresso brasileiro repudia cerco a embaixada em Honduras

Legislativo brasileiro aprova moção de repúdio

Policiais hondurenhos patrulham entorno da Embaixada do Brasil em Tegucigalpa após confronto para dispersar simpatizantes de Zelaya

O Legislativo brasileiro aprovou nesta terça-feira moções de repúdio ao que classificou de cerco militar do governo de Honduras à Embaixada do Brasil em Tegucigalpa, onde está abrigado presidente Manuel Zelaya, que voltou ao seu país nesta segunda-feira quase três meses depois de ser deposto no último dia 28 de junho. Forças de segurança entraram em confronto com cerca de 4.000 apoiadores de Zelaya que estavam em frente e da sede diplomática prédio e prenderam cerca de 150 pessoas, e o prédio ficou sem luz e água em parte desta terça-feira.



Na Câmara dos Deputados, a moção foi proposta pela Mesa Diretora da Casa, com o apoio dos líderes do PT, Cândido Vaccarezza (SP), e do Psol, Ivan Valente (SP). O presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP), disse que a Casa não poderia deixar de se pronunciar contra o que chamou de agressão à embaixada.

"Toda e qualquer agressão de um Estado contra uma embaixada deve ser repudiada; essa é uma questão de Direito Internacional, pois envolve a preservação da soberania", disse Temer.

Em nome do PT, Vaccarezza reiterou o apoio ao retorno de Zelaya ao poder. "Todos os países da América Latina repudiam o golpe em Honduras. E os Estados Unidos têm tomado posições importantes para impedir o governo golpista de se estabilizar", disse Vaccarezza.

O líder do PPS, deputado Fernando Coruja (SC), anunciou que vai requerer o comparecimento à Câmara do ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, para explicar a posição do governo brasileiro antes e depois da chegada de Manuel Zelaya à embaixada.

Amorim, que está em Nova York, acompanhando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva --que discursará nesta quarta-feira na abertura da Assembleia Geral da ONU-- disse que o Brasil não participou do planejamento do retorno de Zelaya, mas que abriu a embaixada quando recebeu um pedido, horas antes da chegada dele ao prédio.

No Senado, a moção de repúdio foi aprovada por unanimidade na Comissão Relações Exteriores, e deve ser apreciada pelo plenário nesta quarta-feira, segundo o líder do governo na Casa, senador Aloísio Mercadante (SP), autor do texto que foi apresentado à comissão pelos senadores Antonio Carlos Valadares (PSB-SE) e Roberto Cavalcanti (PRB-PB).

O texto afirma que as ações do governo interino de Honduras em relação à embaixada brasileira contrariam as leis internacionais e lamenta repressão aos manifestantes pró-Zelaya que desrespeitaram o toque de recolher e foram dispersados à força pela polícia.

A moção pede o respeito à vida de Zelaya e à inviolabilidade da embaixada brasileira e apela ao Conselho de Segurança da ONU e ao Conselho Permanente da OEA (Organização dos Estados Americanos) para que "intervenham positivamente no conflito hondurenho, inclusive mediante a adoção de sanções concretas contra o governo ilegítimo instalado em Tegucigalpa".

À Folha Online, o senador Mercadante disse que a pressão internacional é importante porque o governo interino de Honduras "caminha para uma ditadura". De acordo com ele, há censura a meios de comunicação, prisões políticas e desrespeito aos direitos humanos. "Defendemos a restituição do governo democraticamente eleito, para que Zelaya assuma as suas responsabilidades" disse o senador.

Crítica

Apesar da aprovação das moções, alguns parlamentares destoaram do apoio majoritário a Zelaya ou à posição brasileira na crise hondurenha.

O deputado oposicionista Raul Jungmann (PPS-PE) disse que a lei brasileira proíbe o asilado de fazer pronunciamentos públicos. "A embaixada brasileira não pode servir de plataforma política para o senhor Zelaya", sustentou Jungmann. Ele pediu a Celso Amorim que "determine o fim de todo e qualquer pronunciamento de Zelaya". Formalmente, o presidente deposto não recebeu o status de asilado, sendo considerado um "abrigado", pelo Itamaraty.

Já o deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ) sustentou que Zelaya não pode usar a embaixada como "palanque político". O deputado questionou a forma pela qual o presidente deposto teria ingressado no prédio."Tenho a informação de que ele teria entrado no porta-malas do carro de um funcionário da embaixada", disse.

"Não houve golpe em Honduras, como dizem os radicais 'esquerdizóides'; os militares apenas cumpriram uma ordem de reintegração de posse, dada pela Corte Suprema de Honduras para evitar que Zelaya usasse o voto do povo ignorante", disse Bolsonaro, conhecido por se opor a políticas identificadas com esquerda, apesar de seu partido ser da base aliada do governo Lula. Ele acrescentou que, se ocorresse no Brasil o que aconteceu em Honduras e o presidente se recusasse a sair, as Forças Armadas também iriam retirá-lo do poder.

Mercadante disse que o apoio do Congresso hondurenho e da Suprema Corte do país à deposição de Zelaya não descaracterizam o golpe de Estado.

"Nenhum país democrático reconheceu o novo governo, porque houve claramente um golpe político-militar, sem o devido processo legal, sem direito de defesa", disse o senador, afirmando que as justificativas legais teriam aparecido depois de um golpe na madrugada do dia 28 de junho, quando Zelaya foi detido por militares. "Não é a primeira vez que há simulacros constitucionais tentando legitimar um golpe [...]. No Brasil [após o golpe de 1964] o funcionamento da Suprema Corte e do Congresso foi mantido, tivemos até uma Constituição, nem por isso deixamos de ter uma ditadura que prendia e torturava."

Falando ao plenário, o líder do PSDB, senador Arthur Virgílio (AM) disse que, ao abrigar Zelaya, o Brasil acabou envolvido em uma confusão diplomática e desqualificou-se como um mediador na crise.


"O governo brasileiro combinou isso? Porque se combinou isso, foi uma 'pixotada' diplomática imperdoável. O governo brasileiro não combinou isso? Ainda assim, tem um abacaxi nas mãos para descascar, um abacaxi terrível, porque é uma situação estranha" afirmou Virgílio, um diplomata de carreira que é um dos porta-vozes da oposição ao governo Lula. "O Brasil perdeu a condição de ser interlocutor nessa crise, de ser aquele que daria solução para a crise, porque parece envolvido diretamente na campanha para restabelecer o mandato do presidente Zelaya."

O procedimento do Itamaraty foi defendido em um pronunciamento pelo senador Antonio Carlos Valadares, antes da proposição da moção na Comissão de Relações Exteriores. Ele disse que a embaixada brasileira em Tegucigalpa agiu de acordo com as normas institucionais.

"A embaixada cumpriu religiosamente com o seu dever ao receber como asilado a figura do presidente deposto Manoel Zelaya. E o Brasil tem que se manter firme nessa posição, para não se desmoralizar e nem desmoralizar a permanência de acordos internacionais que são respeitados em todo o mundo", disse o senador governista.

Histórico

Zelaya foi deposto nas primeiras horas de 28 de junho, dia em que pretendia realizar uma consulta popular sobre mudanças constitucionais que havia sido considerada ilegal pela Justiça. Com apoio da Suprema Corte e do Congresso, militares detiveram Zelaya e o expulsaram do país, sob a alegação de que o presidente pretendia infringir a Constituição ao tentar passar por cima da cláusula pétrea que impede reeleições no país.

O presidente deposto, cujo mandato termina no início do próximo ano, nega que pretendesse continuar no poder e se apoia na rejeição internacional ao que é amplamente considerado um golpe de Estado --e no auxílio financeiro, político e logístico do presidente venezuelano-- para desafiar a autoridade do presidente interino e retomar o poder.

Isolado internacionalmente, o presidente interino resiste à pressão externa para que Zelaya seja restituído e governa um país aparentemente dividido em relação à destituição, mas com uma elite política e militar --além da cúpula da Igreja Católica-- unida em torno da interpretação de que houve uma sucessão legítima de poder e de que a Presidência será passada de Micheletti apenas ao presidente eleito em novembro. As eleições estavam marcadas antes da deposição, e nem o presidente interino nem o deposto são candidatos.

Fontes: FOLHA - Efe- Agência Senado - Agência Câmara

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