Abrigo a Zelaya criou problema para o Brasil

O presidente deposto de Honduras, Manuel Zelaya, criou uma dor de cabeça ao governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, afirmaram à Reuters duas fontes do governo nesta terça-feira.

A decisão do hondurenho de refugiar-se n embaixada brasileira em Tegucigalpa jogou o Brasil no centro da crise, colocando-o diante da difícil tarefa de dar uma solução ao impasse.

Segundo relato de um importante auxiliar de Lula, apesar de o Brasil não reconhecer o governo interino e de recusar a legitimidade de uma eleição em novembro conduzida pelo mesmo, o país evitava colocar as mãos no problema. Agora, porém, está envolvido até o pescoço.



"Nós não reconhecemos o presidente de facto. Agora, o que o Zelaya fez, evidentemente, gera um problema", disse a fonte à Reuters sob a condição de anonimato.

Nos bastidores, integrantes do governo ponderam que o Brasil não teve alternativa, pois não poderia recusar abrigo a um presidente legitimamente eleito.

A ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, garantiu que o Brasil não está interferindo nos assuntos internos do país centro-americano.

"O fato de ele ter entrado não signifca em nenhum momento que o Brasil incentivou, adotou, deu cobertura ou nada disso, simplesmente respeitou", disse a ministra a jornalistas na tarde desta terça-feira.

Em Nova York, onde está para participar da Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), o presidente Lula defendeu a postura brasileira. E diante das ameaças iniciais do presidente de facto de Honduras, Roberto Micheletti, de que a violência decorrente seria responsabilidade do Brasil, Lula foi categórico.

"Esperamos que os golpistas não mexam na embaixada brasileira. E esperamos que negociem", disse.

Mas Lula sabe das dificuldades de Zelaya e do pouco apoio que tem dentro do próprio país. Somado a isso, vem ponderando junto a seus interlocutores que o conturbado mandato do colega termina no final do ano, numa possível indicação de que julga o fardo maior que a causa.

Era, portanto, uma briga que o Brasil não teria interesse em comprar. Acabou comprando.

"Não sei como isso será resolvido", acrescentou uma segunda fonte, também pedindo para não ser identificada.

Diante do embaraço, e se todas as possibilidades de diálogo estiverem realmente esgotadas, pode restar ao Brasil a única alternativa de liderar uma negociação para tirar Manuel Zelaya de Honduras. Lula, no entanto, não estaria tratando disso ainda, segundo um auxiliar próximo.

A embaixada brasileira em Tegucigalpa está rodeada de policiais e militares, protagonistas nesta terça de um confronto com seguidores de Zelaya com saldo de inúmeros feridos.

Micheletti exigiu que o governo brasileiro entregasse o presidente deposto, expulso do país em junho sob acusação de ter violado a Constituição para tentar se reeleger.

No início da noite, o governo brasileiro informou que está pedindo uma reunião de emergência do Conselho de Segurança da ONU para discutir a crise em Honduras. Em carta aos membros do Conselho, o Brasil se disse preocupado com a segurança de Zelaya e com a segurança "e integridade física das instalações" da embaixada e de seus funcionários.

Brasil pede reunião do Conselho de Segurança da ONU sobre Honduras

O Brasil anunciou nesta terça-feira (22) que está pedindo uma reunião de emergência do Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas para discutir a crise em Honduras, após o retorno de surpresa ao país do presidente deposto, Manuel Zelaya, ocorrido na véspera.

Em carta aos membros do Conselho, o Brasil se disse preocupado "com a segurança do presidente Zelaya e com a segurança e integridade física das instalações da embaixada (brasileira) e funcionários".

A carta é assinada pela embaixadora brasileira para a ONU, Maria Luiza Ribeiro Viotti.

A intenção de convocar a reunião havia sido aventada horas antes pelo chanceler brasileiro, Celso Amorim, que está em Nova York para participar da Assembleia Geral das Nações Unidas.



Abrigo a Zelaya cria situação 'delicada' para o Brasil, avaliam analistas

O refúgio do presidente deposto de Honduras, Manuel Zelaya, na embaixada brasileira cria uma situação "delicada" e "complexa" para o país, na avaliação de especialistas em relações internacionais.

Zelaya está na embaixada do Brasil em Honduras desde segunda-feira (21). Militares cercam o prédio, que abriga o presidente deposto, e manifestantes favoráveis a Zelaya foram retirados na frente da embaixada. Ele foi deposto há quase três meses, acusado de tentar mudar a Constituição para permanecer mais tempo no poder.

Para Rubens Antonio Barbosa, o ex-embaixador do Brasil na Inglaterra (1994-1999) e nos Estados Unidos (1999-2004) e ex-secretário de Assuntos Internacionais do Ministério da Fazenda, Rubens Antonio Barbosa, o país perdeu a legitimidade de participar da negociação sobre a solução política para Honduras.

"Honduras não vai permitir que o Brasil participe da intermediação porque tomou partido ao albergar Zelaya na própria embaixada. O Brasil não faria mediação porque tomou partido", afirmou Barbosa, em entrevista ao G1.

Na opinião do ex-embaixador, o governo pode ganhar uma "grande dor de cabeça" por ter abrigado o presidente deposto. "A situação é muito grave e acho que as autoridades não estão avaliando a extensão da decisão de permitir que ele entrasse na embaixada. É uma interferência nas decisões de um país."

Barbosa diz que a situação pode se resolver desde a forma mais positiva, com o Brasil atuando para uma solução no conflito, até a mais negativa, que seria o agravamento da confrontação entre militares de Honduras e partidários de Zelaya.

Professor de Relações Internacionais e coordenador do Núcleo de Estudos Estratégicos da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Pedro Paulo Funari diz que a atitude colocou o Brasil em uma "situação delicada" e que "dificilmente o desfecho será positivo para o país".

"Coloca o Brasil em uma situação delicada porque restam poucas opções ao país. Uma intervenção brasileira não é aconselhada, mas por outro lado, o Brasil se coloca em posição de não poder aceitar que sua sede diplomática seja atacada. Acho que as próximas horas serão decisivas para analisar qual será o impacto para o país."

Estratégia

Funari diz que a posição do governo interino de Honduras em cortar a energia na embaixada pode obrigar o país a ter de desocupar o prédio.

"O sítio é uma estratégia militar para forçar que o pessoal da embaixada seja liberado. Para, assim que os brasileiros saírem, eles invadirem e prenderem Zelaya. Se isso acontecer, por exemplo, o Brasil terá que cortar relações, não terá outra saída."

Na avaliação do professor, no entanto, o Brasil não queria estar nessa situação. "O Brasil tomou partido desde o início a favor de Zelaya, mas não queria, com certeza, se envolver tanto nessa questão. O Brasil está no meio de um furacão, mas não vamos entrar em uma guerra por causa disso. Pode parecer positivo para o Brasil, mas não foi."

O também professor de Relações Internacionais Amado Luiz Cervo, da Universidade de Brasília (UnB) e do Instituto Rio Branco - que forma diplomatas -, também destaca que o Brasil vive uma situação "difícil".

"É o preço que Lula está pagando pelo seu papel de bombeiro de conflitos. É a imagem que Lula tem, que o governo tem, de um governo moderado. Acho que Zelaya tomou uma decisão oportuna e oportunista porque o Brasil tem um peso político e moral muito grande em toda a América."

Para Cervo, no entanto, Zelaya não deveria se utilizar do espaço da embaixada para "insuflar as massas". "Isso não é nada cortês com o refúgio que a embaixada concedeu."

Consequências

O professor crê que a situação não deve trazer "consequências mais graves" ao governo brasileiro. "O Brasil certamente agirá com base nas instituições democráticas, vai procurar uma solução ou intervenção de fora. Caso haja necessidade de força contra força, vai buscar na OEA (Organização dos Estados Americanos (OEA)."

A professora Sonia de Camargo, do Instituto de Relações Internacionais da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), avalia que a situação é de "grande complexidade", mas que pode ser positiva para o Brasil.

"O Brasil está com posição de entrar no conflito, negociar. Eu acho interessante a posição que o Brasil tomou. Vamos ver como será negociada. O Brasil pretende que ele saia da embaixada e negocie com presidente em exercício e que se comprometa em não abrir possibilidade de nova recondução. Isso seria um acordo possível."





Fonte: Terra - G1 - TV Globo

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