Referendo de 30 de agosto de 1999 definiu independência do país.
O policial brasileiro Augusto Santos, em missão da ONU em Timor Leste (Foto: Reprodução/Arquivo Pessoal)
Dez anos depois de votar por sua independência em um referendo nacional, Timor Leste é um país pobre, carente de infraestrutura e que tem população e situação política instáveis, segundo o policial pernambucano Augusto Santos, que atua em missão da Organização das Nações Unidas na ex-colônia portuguesa e indonésia. Em entrevista ao G1, por e-mail e telefone, Santos falou das dificuldades de viver no país que completa uma década e que está 12 horas à frente do Brasil pelo fuso horário, mas que vive no passado em aspectos de organização, segurança e lazer.
Um dos países mais novos do mundo, Timor Leste é uma ex-colônia portuguesa que foi invadida pela Indonésia em 1975 e só se tornou independente de fato depois que a população foi às urnas em um referendo sobre sua autonomia. Em 30 de agosto de 1999, quase 80% dos 437 mil timorenses habilitados para votar escolheram deixar de ser parte da Indonésia e se tornar um novo país.
Mapa mostra a localização de Timor Leste
A divulgação dos resultados da consulta popular, alguns dias após a votação, causou violentos confrontos no país. Guerrilheiros que apoiavam a manutenção do controle indonésio iniciaram uma campanha de retaliação, matando mais de mi pessoas e destruindo a infraestrutura do país. A violência fez com que mais de 300 mil Timorenses fugissem e se tornassem refugiados em outros países. Somente com a chegada de tropas internacionais da ONU que a situação se estabilizou. Militares brasileiros, como Santos, têm atuado na região desde então, ajudando a manter a ordem e a evitar novos surtos de violência.
Sem estrutura
Em Dili, capital do país, ele contou que não há endereços e números nas casas, que são encontradas por descrição e pontos de referências; há problemas de abastecimento de água e eletricidade nas casas, que normalmente não têm banheiro e cozinha da forma como se conhece no Brasil. A recomendação, disse, é que água mineral engarrafada seja usada até para escovar os dentes, e nos banheiros não há reservatório de água e chuveiro.
A comida é cara e não é seguro comer em qualquer restaurante. Para fazer churrascos em casa, é preciso importar carne da Nova Zelândia e pagar mais de US$ 10 por um saco de carvão. Na cidade não há parques, cinemas, lojas ou outras atrações para a diversão, faz calor acima dos 30 graus mesmo à noite e, para completar, “o povo tem o costume de jogar pedras”, disse, explicando que os carros da ONU costumavam ser alvos dos projéteis.
O policial contou que chegou a estudar um pouco sobre a situação do Timor Leste antes da viagem, e que aceitou ir ao país pelo fato de o português ser um dos idiomas oficiais, o que poderia facilitar o trabalho. “A primeira coisa que me chocou quando cheguei aqui foi a falta de infraestrutura. É um país muito jovem, e que ficou muito destruído depois que a Indonésia deixou o território [há dez anos]. Achava que ia encontrar condições melhores de vivência e de trabalho, mas as coisas são bem complicadas”, disse Santos.
Além da falta de estrutura, Santos disse que o contato com a população local também dificulta na adaptação. Os timorenses, contou, mudam de comportamento de forma repentina, podendo se tornar violentos. “Eles são instáveis. São simpáticos em alguns momentos, cumprimentam, sorriem, mas por outro lado, jogam pedras na sua casa quando se sentirem incomodadas”, contou. Segundo ele, pela pobreza do país é normal que os estrangeiros sejam explorados economicamente , “sempre vistos como minas de ouro”.
A comunicação com a população local se dá em português e inglês, contou, já que o principal idioma usado pela população, e pelas instituições políticas, o tétum, é de difícil compreensão. “Algumas pessoas aqui, especialmente as mais velhas, falam português em uma versão mais próximas do de Portugal. O tétum é difícil de aprender, tem muitas palavras que se parecem, que confundem a gente. Temos uma equipe de intérpretes na área em que trabalho, até porque os processos têm q ser feitos nas línguas locais. O inglês é muito bem entendido, até porque já são dez anos de missão da ONU.”
Solenidade de entrega da Medalha da ONU aos integrantes da Guarda Nacional Republicana de Portugal (Foto: Reprodução/Arquivo pessoal)
Segurança e violência
A mesma instabilidade também existe na política, pois tudo pode mudar de uma hora para a outra, o que deixa a equipe internacional em alerta por conta do aniversário do referendo da independência. O medo é que se repitam os confrontos de então, ou outros que aconteceram nos últimos anos. “Temos que ficar atentos a todos os tipos de movimentação. Percebemos, por exemplo, que quando algo está para acontecer e o clima está tenso, não é possível ver crianças nas ruas, pois todas ficam em casa”, disse.
O receio, segundo Santos, é que há rumores de que alguns dos partidos, todos remanescentes das antigas guerrilhas, poderão armar protestos violentos no domingo. “Hoje vivemos num clima tranquilo. Está tudo calmo, porém, em 2006, tudo estava tão pacífico que a ONU começou a reduzir o seu staff e programar a saída definitiva, quando aconteceu a grande crise, alguns dizem que foi motivada pela oposição, querendo demonstrar a fragilidade do governo, e outros ainda dizem que isso foi por receio da proximidade do final da ajuda internacional”, disse, justificando a preocupação.
A atuação policial de Santos na Missão da ONU, entretanto, não tem relação direta com crimes cotidianos ou a violência que pode vir a eclodir por motivos políticos. Ele trabalha investigando crimes de corrupção do governo, analisando homicídios e violência registrados na crise de 2006. O trabalho, segundo ele, também acaba sendo dificultado pela desorganização e falta de estrutura do país. “Temos dificuldade em localizar as pessoas, porque elas não têm um registro em cartório e os endereços são dados apenas com base em descrições e proximidade com pontos de referência. Acabamos dependendo de um ‘líder comunitário’ que nos mostram como chegar na casa das pessoas.”
Do que acompanha sobre a segurança no Timor Leste, ele explicou que, apesar da instabilidade, a violência tem um caráter diferente no país, comparado com sua experiência como policial em Pernambuco. “No Recife tem mais assaltos, mas aqui tem mais violência doméstica, por exemplo”, disse. Os crimes mais comuns em Dili, segundo ele, são o arrombamento de residências, o roubo de bolsas nas ruas, por ladrões de moto e a violência contra as mulheres, por conta da cultura machista.
A sensação de insegurança, entretanto, é maior em Dili de que no Recife ou em grandes cidades do Brasil. “Em Pernambuco eu conheço as ameaça, sei dos riscos. Aqui não. Do jeito que as pessoas podem estar bem em um momento, de repente tudo pode mudar e elas podem passar a nos ver como inimigos”, contou.
Saudades e futuro
Casado e pai de dois filhos, ele chegou à capital de Timor Leste em maio, em missão de um ano que não sabe se vai cumprir até o fim, uma vez que já tenta novos concursos internos na ONU, e que diz sentir falta da família, que ficou no Recife.
“A maior dificuldade enfrentada é a distância, a saudade de casa, da família e dos amigos. Isso afeta a todos”, contou. “Graças à tecnologia, temos a internet que nos ajuda a minorar o banzo, mas, dado o atraso que o país enfrenta pelo tempo que passou em conflito e por tudo que foi destruído, ela nem sempre colabora”, disse, explicando que a conexão à rede é lenta e precária.
A distância dificulta ainda mais por causa da falta do que fazer. Fora os horários de trabalho, não há muitas opções de lazer. “Não há parques, cinemas, shoppings, zoológicos, nada mesmo. Eu comprei uma bicicleta e tenho dado as minhas voltas por aí. Depois tento falar com a família e com os amigos pela internet e ocupo o resto do meu tempo livre escrevendo crônicas, e assim tenho conseguido manter a mente sadia, eu acho.”
Santos demonstra pouca esperança para o futuro do país. Segundo ele, o povo timorense é um tanto letárgico. “Acredito que já se acomodaram a uma década de ajuda estrangeira. Não os vejo apresentarem-se dispostos para trabalhar e progredir. Os comércios são conduzidos por chineses, malaios e filipinos. As empresas maiores são australianas ou portuguesas. Os mais novos vivem perambulando pelas ruas ou acompanhando brigas de galo, geralmente à beira da praia e os poucos que se ocupam com algo, resumem-se a vender créditos telefônicos.”
Conheça a história de Timor Leste
Fontes: G1/Daniel Buarque
Serviços de tradução inglês - português, de alta qualidade. Entrega rápida via e-mail. Preços acessíveis e qualidade assegurada.
Entre em contato e saiba mais
e-mail: airkrane@gmail.com - falar com Jack
Nenhum comentário:
Postar um comentário